quarta-feira, 8 de março de 2017

O fenômeno da globalização segundo Milton Santos.

Para Milton Santos, a globalização é, de certa forma o ápice do processo de internacionalização do mundo capitalista. Esse conceito se materializa de diversas maneiras no nosso cotidiano, já que o processo de internacionalização, implica a construção de uma rede de comunicação, que interliga o local ao global, numa mútua relação de influência. Podemos falar de uma relação entre localismos e globalismos. Nessa dinâmica, somos em certo sentido massa de manobra e ao mesmo tempo, força motriz, que alimenta um sistema marcado por uma infinidade de possibilidades, expressas nos fluxos da globalização. Trocando em miúdos, a globalização produz e sustenta, o fluxo do capital, de mercadorias, de pessoas, de informação e, sobretudo, fluxos culturais, que contribuem para a construção da perspectiva de aldeia global. Essa perspectiva, além de alienante, esmaga as particularidades da identidade de cultural de cada povo, de suas etnias e processos históricos, reduzidos a uma padronização cultural.

É nessa perspectiva que Milton Santos nos apresenta o tema da globalização a partir de uma tríplice visão de mundo. Assim, esse grande geógrafo brasileiro, nos apresentará em seu livro "por uma outra globalização", o mundo como fábula,como perversidade e como possibilidade.

Em seu livro, Milton Santos afirma: "vivemos num mundo confuso e confusamente percebido. Haveria nisto um paradoxo pedindo uma explicação? De um lado, é abusivamente mencionado o extraordinário progresso das ciências e das técnicas, das quais um dos frutos são os novos materiais artificiais que autorizam a precisão e a intencionalidade. De outro lado, há, também, referência obrigatória à aceleração contemporânea e todas as vertigens que cria, a começar pela própria velocidade. Todos esses, porém, são dados de um mundo físico fabricado pelo homem, cuja utilização, aliás, permite que o mundo se torne esse mundo confuso e confusamente percebido." Aqui, torna-se clara a visão do autor, em reconhecer o progresso das ciências e das técnicas, reconhecidamente marcadas pela precisão e intencionalidade. De fato, o avanço das técnicas produziram uma profunda transformação na relação do ser humano com o espaço geográfico. Poderíamos dizer até que, essa transformação se mostra irreversível e veloz. Os sistemas produtivos se tornam cada vez mais equipados de uma força transformadora que tem influenciado o comportamento humano e suas mais variadas relações. Contudo, todo esse avanço, produz efeitos potencialmente perigosos, já que nutre o crescente interesse pelo consumo e pelo descarte. Consumimos mais recursos naturais e, consequentemente, também produtos industrializados, ações que, inevitavelmente, nos levam a descartar de forma mais rápida e danosa. Mergulhamos o planeta numa condição extrema de exploração e degradação. Essa degradação não se mostra apenas na perspectiva ambiental, as relações sociais, econômicas, políticas, também apontam para uma insustentabilidade, que concentra a riqueza nas mãos de uma minoria, aprofundando as mais diversas formas de exclusão social e empobrecimento.

Segundo Milton Santos, explicações mecanicistas são, todavia, insuficientes. É a maneira como, sobre essa base material, se produz a história humana que é a verdadeira responsável pela criação da torre de babel  em que vive a nossa era globalizada. Quando se permite imaginar que se tornou possível a criação de um mundo veraz, o que é imposto aos espíritos é um mundo de fabulações , que se aproveita do alargamento de todos os contextos (M. Santos, A Natureza do espaço, 1996) para consagrar um discurso único. Seus fundamentos são a informação e o seu império, que encontram alicerce na produção de imagens e do imaginário, e se põe a serviço do império do dinheiro, fundado este na economização e na monetarização da vida social e da vida pessoal. De fato, se desejamos escapar à crença de que esse mundo assim apresentado é verdadeiro, e não queremos admitir a permanência de sua percepção enganosa, devemos considerar a existência de pelo menos três mundos num só. O primeiro seria o mundo tal como nos fazem vê-lo: a globalização como fábula; o segundo seria o mundo tal como ele é: a globalização como perversidade; e o terceiro, o mundo como ele pode ser: uma outra globalização.

Fonte: SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal / Milton Santos. - 22ª ed. - Rio de Janeiro: Record, 2012.